Da indignidade da pobreza e da configurada inconstitucionalidade do artigo 48.º do Regime Geral do Processo Tutelar Cível e do artigo 738.º, n.º 4, do Código de Processo Civil, à luz, entre outros, dos artigos 1.º, 13.º, 18.º e 63.º, n.º 3, da Constituição da República Portuguesa

Escrevemos este breve artigo sobre um tema complexo e sempre atual, o do limite da impenhorabilidade de rendimentos quando o crédito emerge de uma obrigação de alimentos e da sua (in)compatibilidade com a preservação e tutela da dignidade da pessoa.

Veremos quer o atual artigo 48.º do Regime Geral do Processo Tutelar Cível (R.G.P.T.C.), dado que não estabelece especificamente critérios ou limites para as deduções que estatui, tal como não prevê, sequer, tratamento diferente para os distintos tipos de rendimentos que elenca – não distinguindo, por exemplo, no caso das pensões, as de sobrevivência ou de invalidez –, quer o artigo 738.º do Código de Processo Civil (C.P.C.), cuja epígrafe é bens parcialmente penhoráveis.

O n.º 3 do artigo 738.º do C.P.C. estabelece como limite mínimo da impenhorabilidade, quando o executado não tenha outro rendimento, o montante equivalente a um salário mínimo nacional, 635 Euros. Contudo, o n.º 4 dispõe que “[o] disposto nos números anteriores não se aplica quando o crédito exequendo for de alimentos, caso em que é impenhorável a quantia equivalente à totalidade da pensão social do regime não contributivo”, ou seja, é impenhorável (apenas) a quantia de 211.79 Euros – segundo o disposto no artigo 18.º da Portaria n.º 28/2020, de 31/01, “[o] quantitativo mensal das pensões de velhice do regime não contributivo é fixado em (euro) 211,79”.

Na análise do problema que estas normas levantam, para nós de inconstitucionalidade, destacamos, a montante, a indiferença do legislador revelada no teor do artigo 48.º do R.G.P.T.C., cuja redação integral deixamos em nota – tanto mais que, de acordo com o artigo 33.º, n.º 1, do R.G.P.T.C., “[n]os casos omissos são de observar, com as devidas adaptações, as regras de processo civil que não contrariem os fins da jurisdição de menores” –, e que restringe direitos, liberdades e garantias sem o fazer com limites que permitam, sequer, aferir a adequação, a necessidade e a proporcionalidade dos mesmos, à luz, entre outros, do disposto no artigo 18.º da Constituição da República Portuguesa, (C.R.P.)