(Ainda a) Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março – uma segunda leitura

 

1. Introdução

A sabedoria popular está, muitas vezes, errada, mas há também ocasiões em que é perfeitamente certeira, como quando diz “O que nasce torto, tarde ou nunca se endireita”.

Efetivamente, a Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, surgiu de forma muito conturbada e apressada, até por causa do seu contexto, e facilmente se percebeu que levantava muitas questões não resolvidas ou nada claras e que deram azo a interpretações muito díspares, algumas das quais sem qualquer sustentação na lei, nos tribunais e fora deles.

E, de facto, parafraseando Kirchmann, três palavras (más, neste caso, como veremos de seguida) do legislador e uma série de artigos publicados eletronicamente passam para o grande arquivo (quase morto) da internet, perdendo a maior parte da sua utilidade e interesse práticos.

Ora, poucos dias passados da publicação deste diploma legal, esta Lei irá já ser alterada via da aprovação do Decreto n.º 6/XIV da Assembleia da República[1], que contém, de resto e expressamente, uma “Norma interpretativa” (Art. 5.º)[2], dispondo que, como o tinha defendido, “O artigo 10.º da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, deve ser interpretado no sentido de ser considerada a data de 9 de março de 2020, prevista no artigo 37.º do Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 13 de março, para o início da produção de efeitos dos seus artigos 14.º a 16.º, como a data de início de produção de efeitos das disposições do artigo 7.º da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março”.

Por seu lado, as alterações introduzidas no Art. 7.º desta Lei produzirão efeito desde a mencionada data de 9/3/2020 (Art. 6.º, n.º 2, primeira parte), “com exceção das normas aplicáveis aos processos urgentes e do disposto no seu n.º 12, que só produzem efeitos na data da entrada em vigor da presente lei” (6.º, n.º 2, segunda parte) – “no dia seguinte ao da sua publicação” (Art. 7.º).