A responsabilidade pelo pedido infundado ou pela apresentação indevida à insolvência

(Dissertação de Mestrado)

A – O artigo 22.º do CIRE representa no nosso sistema jurídico uma previsão de responsabilidade civil, especial relativamente ao artigo 483.º do Código Civil, que não se confunde nem se reconduz a um fundamento de mera responsabilidade processual, designadamente por litigância de má fé, com a qual pode perfeitamente coexistir e cumular-se.
B – O pedido infundado de insolvência é aquele que carece de fundamento, que é deduzido sem que ocorram os factos que integram a previsão legal de insolvência. A apresentação indevida é o pedido do devedor tendente à sua própria declaração de insolvência sem que esteja verificada a situação de impossibilidade de cumprimento das obrigações vencidas.
C – Fundando-se o pedido num dos factos indiciários da insolvência previstos no CIRE, não haverá responsabilidade do requerente se aqueles factos vierem a ser demonstrados mas a insolvência acabar por não ser decretada, designadamente porque o credor provou que apesar disso é solvente.
D – Se o pedido for procedente, o devedor que pretenda demonstrar que o pedido era infundado e exigir responsabilidade do requerente terá de requerer e obter previamente a revisão da sentença que decretou a insolvência, reunidos que sejam os requisitos do recurso de revisão.
E – O artigo 22.º do CIRE não é uma norma especial relativamente à norma geral do artigo 484.º do Código Civil, pelo que não afasta a aplicação desta previsão específica de ilicitude nos casos em que o requerimento de insolvência se funde em factos falsos capazes de afectar o crédito e o bom nome do devedor requerido.
F – Nesses casos, o interessado pode deduzir um pedido de indemnização cumulando os dois fundamentos de responsabilidade, circunstância em que o responsável responde pelas consequências do pedido infundado, mesmo que tenha actuado apenas com mera negligência.
G – Se a insolvência é requerida pelo credor apenas são indemnizáveis os danos sofridos pelo devedor; quando é o devedor a apresentar-se à insolvência só são indemnizáveis os danos sofridos pelos credores.
H – O artigo 22.º do CIRE confere a danos situados na esfera da relação creditícia protecção delitual que de outra forma não teriam, mas isso não transforma a norma numa previsão especial de tutela delitual de danos económicos puros que permita a qualquer terceiro afectado nos seus interesses pela declaração de insolvência accionar esse mecanismo de responsabilidade.
I – A responsabilidade prevista na norma tem como requisito o dolo – em qualquer das suas modalidades – do autor na formulação do pedido, não bastando para o efeito que ele tenha actuado com mera negligência, ainda que grosseira, solução que apenas se pode defender de lege ferenda.