Separação de poderes e criação do Direito: alguns tópicos para reflexão

(Discurso de abertura das III Jornadas Açorianas de Direito)

[Excerto:]

1.Gostaria, antes de mais de saudar os organizadores destas Jornadas pela persistência do desafio de deslocarem o centro de debate intelectual sobre o direito e a sua aplicação prática, para os Açores.
As «Jornadas de Direito dos Acores» são já, pode dizer-se, um ponto de referência sobre o que é relevante e importante discutir no direito e na justiça e que vai para além da superficialidade da «espuma dos dias».
O título das jornadas que agora se iniciam, «A criação judicial de direito no limiar do século XXI», demonstra bem a capacidade criativa e intelectual dos seus organizadores. A “criação judicial de direito” é, no mínimo, um tema provocatório.
Diria, no entanto, numa espécie de discurso hoje muito acertivo que estamos perante um tema “provocatório bom”, naturalmente por oposição à “provocação má”, não fundamentada que decorre apenas do non sense e do vazio de um qualquer palpite superficial a propósito de tudo.
Aceitando o desafio da “provocação boa”, importa começar exatamente por questionar o próprio título: pode falar-se em criação judicial de direito? E a ser admissível esta construção, onde esta a sua legitimidade? Permitirá o princípio da separação de poderes que se fale em criação judicial de direito?
A garantia democrática sustentada na legitimidade constitucional de um órgão de soberania fazer as leis, outro executá-las e ser dado a um terceiro o poder de controlo e resolução de conflitos por aplicação das mesmas, sustentará uma assunção criativa de direito por parte destes últimos?
A legitimação direta dos Tribunais no exercício das suas funções, ainda que não eletiva, será compatível com uma dimensão, necessariamente vinculante, de criação de direito?
Todas estas perguntas, caros amigos, são perguntas “do milhão de dólares”!
E a todas elas, ao longo dos anos, constitucionalistas, filósofos do direito, sociólogos e eminentes juristas têm tentado responder sem grande consenso.
Está visto, por isso que “a história sem fim” do problema se mantém atual e certamente não encontraremos hoje o vencedor do concurso.
Interessa-nos, no entanto, imergir no debate numa perspetiva mais pragmática e sobretudo evidenciar o seu reflexo num ponto de vista da teoria da jurisdição.
Mas sobretudo interessa-nos reanimar a questão à face ou no âmbito da dimensão transnacional do papel do juiz e, concretamente, na sua dimensão europeia.
Proponho, por isso, alguns tópicos e não mais do que isso, para início de debate.
Separação de poderes e jurisdição, constitucionalismos, os juízes no espaço judiciário europeu e a latitude da criação do direito pelos juízes.

[…Em versão integral na JULGAR em papel n.º 25 e, nesta ligação, no primeiro quadrimestre de 2017…]