Punitividade e penas de substituição — relatio paradoxal?

(Breves reflexões a partir da realidade portuguesa )

I) Introdução

A questão de saber até que ponto uma dada comunidade é mais ou menos punitiva convoca intricados e diversos problemas ao Direito Penal e à Criminologia. Em primeiro lugar, não existe acordo quanto ao modo de medir essa realidade; as metodologias usadas têm sido diversificadas e nenhuma delas é isenta de críticas. Por outro lado, a própria noção de punitividade não é unívoca. Geralmente, julgamos poder afirmar que por ela se entende a percepção da comunidade (ou de um seu grupo determinado) quanto ao modo mais ou menos severo como o sistema de justiça lida com um facto ilícito. Usando o conceito proposto por Lautmann/Klimke, trata-se da «atitude ou tendência generalizada para reagir com sanções onerosas a desvios conhecidos à norma». O conceito de «punitivo», para os mesmos autores, significa a escolha preferencial de sanções de índole retributiva, em detrimento de mecanismos de conciliação, mas de modo a que, em função dos distintos momentos históricos, se pode falar de um «continuum punitivo-permissivo» (Kontinuum punitiv-permissiv).

Todavia, para isto aferir impõe-se que se disponha de pontos de comparação, ou seja, o princípio da proporcionalidade entre a gravidade do delito e da sanção é o princípio-rector nesta conceptualização. Ora, sendo essa proporcionalidade por natureza casuística, logo nos damos conta da dificuldade em encontrar um denominador comum apto a traduzir esse grau de punitividade. Acresce que, como tem sido evidenciado por estudos recentes, o modo como as perguntas são colocadas aos respectivos destinatários em muito influi nas respostas obtidas. O grau de relativa impunidade que a comunidade como um todo pode eventualmente sentir num dado momento e espaço dependem em muito, por outro lado, do questionamento sobre se os destinatários se consideram ou não adequadamente informados quanto à própria questão e ao funcionamento do sistema de justiça. Assim, é comum observar que, quando se oferece, nos inquéritos, a possibilidade de os respondentes dizerem que não se acham suficientemente informados sobre o grau de punitividade do sistema, a taxa de respostas quanto a uma suposta falta de vigor punitivo tende a diminuir. Tal é demonstrativo de que, como regra, os sujeitos se sentem mal informados sobre a problemática.